Roube, mas não faça sexo!


por Mazu

CPI no Brasil sempre foi uma coisa mais cômica e triste do que deveria ser. Mês passado, escutei no rádio alguns trechos das discussões entre os senadores e os ouvi chamando uns aos outros de tchutchuca e tigrão. Sério, posso dar o contexto que quiser para isso, nenhum fica bom.

Carlos Cachoeira, contraventor
Sob meu ponto de vista, a gente se distrai com tudo por aqui quando devia prestar atenção em aspectos políticos da situação do nosso país. Acho que só lembramos que a CPI investigava o senador Demóstenes quando ele foi efetivamente cassado. A CPI chamada de CPI do Cachoeira era, na verdade, sobre o Demóstenes Torres. O "contraventor" (eu adoro quando a mídia usa essa expressão), Carlos Cachoeira, é civil, e o procedimento investigatório de civil é inquérito policial, CPI é só para os caras do congresso.


Denise Leitão e Senador Ciro Nogueira
Dentre as distrações do processo investigatório, que foram muitas por sinal, temos a história da advogada e assessora de senador, Denise Leitão. Aparentemente, ela distrai todo mundo, eu, você e a mídia, porque ela é muito bonita e faz sexo. Enfim. Aparentemente, ela está sendo demitida do cargo por isso também. Não conheço a moça, mas levanta mão aí quem acha isso, assim, injusto. A história é que um ex-namorado da assessora, a qual vinha fazendo sucesso pela aparência física, resolveu soltar um vídeo íntimo dela na internet. Fatos relevantes: ela não estava nas dependências do órgão que trabalha, ela não estava com um de seus superiores ou subalternos e ela não estava em horário de serviço. E vai perder o emprego porque o senador para o qual trabalha está constrangido com o comportamento dela e não quer ficar dando explicações sobre isso o resto do mandato. Puxa vida, que dó dele, né. Bom, chamei atenção para onde ela estava e com quem (no vídeo) porque essas seriam razões, do ponto de vista jurídico, para demissão de servidor de órgão público, a primeira delas descrita como "conduta escandalosa na repartição" no estatuto do servidor público, lei 8112. Mas como disse, não foi o caso. Ela não descumpriu norma, nem desobedeceu lei alguma.

Esse tweet, genial, diga-se de passagem, me fez pensar o que diabos é a honestidade feminina afinal de contas? Legalmente falando, foi só em 2005 que o texto do código penal substitui “mulher honesta” por “mulher” para descrever o crime de estupro, foi nesse ano também que adultério deixou de ser crime, porque até então vinha sendo usado como defesa para homens que assassinavam suas parceiras infiéis.

O tweet faz uma relação bem bacana entre o ato (sexo consensual com um homem adulto) de Denise Leitão e o ato de Jaqueline Roriz, filmada recebendo dinheiro de caixa 2 para campanha. A Roriz foi absolvida pelos seus colegas deputados, agora, será que se depois de receber o dinheiro ela fizesse sexo com alguém no mesmo vídeo, de maneira não relacionada com sua profissão, ela seria absolvida também? Será que se tivéssemos notícia de sua vida sexual de alguma forma, e essa vida fosse diferente do “padrão”, ela seria sequer eleita?

Tenho uma amiga muito bonita que depois de uns 15 anos trabalhando em um órgão foi promovida para uma função de chefia. A rádio corredor diz que ela transou com alguém por isso. Eu sei que não foi assim, e ela sabe, ela não liga para o que dizem, mas eu sim. Fico brava, compro briga, enfim. Isso por que, no ambiente de trabalho, mulher sofre para afirmar a própria competência e quando é bonita, parece que é pior. Aparentemente, beleza e liberdade sexual não podem coexistir com competência. A gente tem sempre um estereótipo para derrubar nesse domínio implícito do masculino. Já disse, não conheço a Denise, mas, estou com a impressão de que ela está passando por algo parecido, em um grau super aumentado.
Agente Tapajós, investigador da operação
Monte Carlo, morto em Brasília, semana passada.

O Código Penal e Civil brasileiros mudaram, mas alguns estigmas permanecem. A nossa honestidade e competência continuam, de uma forma esquisita e triste, sendo definidas pelo tanto de parceiros e sexo que uma mulher tem durante a vida, pela forma que se veste e se comporta.

Ana Lídia foi torturada, estuprada e morta por asfixia,
na década de 1970, em Brasília.
Os suspeitos do crime foram o seu próprio irmão
(que a teria vendido para traficantes)
e alguns filhos de políticos e
importantes membros da sociedade brasiliense.
E já que estou falando em honestidade e já que comecei falando de CPI, preciso extrapolar: não só o conceito de honestidade feminina é muito complicado neste país, o conceito de honestidade no geral é de chorar. Lembrando que o Demóstenes volta ao cargo de procurador da justiça, lembrando que o grau de separação entre o Cachoeira e os políticos brasileiros (todos eles!) é menor do que o do Facebook, lembrando que o senador Collor (que dizem estar envolvido em uma história mal contada de assassinato e estupro de vulnerável na juventude em Brasília, entre outras coisas) é agora Presidente de Comissão de Ética. Lembrando que dois policiais federais do caso Cachoeira foram assassinados a semana passada. Sério mesmo, levando em consideração tudo isso, o que será que é ser honesto por aqui?

Bom, eu tenho a resposta para as mulheres: roube se quiser, mas não faça sexo. Para homens, é mais fácil, foram eles que escreveram as leis.

6 comentários:

  1. Notícia relacionada:
    http://g1.globo.com/distrito-federal/noticia/2012/07/advogada-divulga-foto-e-diz-que-assessora-nao-merece-ser-demitida.html

    ResponderExcluir
  2. Olha o nível de escrotice dessa notícia da Folha, o cara nem assinar assinou.
    http://f5.folha.uol.com.br/humanos/1132687-assessora-do-senado-que-fez-video-de-sexo-perde-o-emprego-e-diz-que-decisao-e-machista.shtml

    ResponderExcluir
  3. A mídia brasileira no geral é machista. Até os esquerdistas são machistas e vivem dizendo que há coisas mais importantes pra discutir que as causas... feministas. Meu c*, né? Eu gostaria de não me preocupar com a assessora do senado federal, mas se a mídia usa a imagem dela pra reafirmar estereótipos machistas, e se a política a condena não tendo ela cometido crime algum, então julgo que o assunto me concerne, sim, que é importante, sim. Essas matérias folha/uol/g1/terra etc. só servem prum monte de comentador escroto com 2% de cérebro ficar destilando todo tipo de preconceito - mostrando o nível de tosquice da classe média brasileira.

    ResponderExcluir
  4. Olhaí, Mazu: http://g1.globo.com/politica/noticia/2012/08/ex-assessora-diz-que-exoneracao-por-video-foi-desumana-e-machista.html

    ResponderExcluir
  5. Ah, o comment de cima é meu, esqueci de assinar... O.o

    ResponderExcluir
  6. Pequeno detalhe: ela tinha um cargo em comissão, não era concursada e não cumpria horário. Quase ninguém no gabinete do deputado a conhecia. A vida sexual dela não diz respeito a ninguém, entretanto a vida dela como agente público diz respeito a toda a sociedade.

    ResponderExcluir