Porque a Darlene, sua filha, sua mãe e eu precisamos do feminismo

por Mazu



Na semana passada, recebemos um comentário dizendo que ser feminista era uma coisa ultrapassada e brega. A gente não deu mais do que a atenção merecida ao comentário por outros motivos, mas a questão de o feminismo ser visto como coisa do passado vira e mexe aparece.

Já falei sobre isso, e a Rô já falou sobre a necessidade do feminismo, mas nada melhor que uma história para deixar claro o quanto o movimento ainda tem para fazer e o quanto é necessário.

Vou aproveitar o momento de contação de histórias verídicas, que anda rolando com o Sexismo de cada dia, e vou contar a história da Darlene.

A Darlene trabalha em um salão de beleza que eu costumo frequentar, perto da minha casa. (Este é o momento em que as determinadas pessoas despecam de seus Louboutins porque uma feminista diz que vai ao Salão de Beleza). 

Enfim, Darlene tem 28 anos e uma filha de 12 anos. Até aí, a gente pensa: gravidez na adolescência, quem nunca viu? Do jeito que aconteceu com ela, eu nunca vi.

A Darlene, quando tinha 14 anos, morava no interior do Maranhão, numa cidade que, segundo ela, não tinha nem energia elétrica. Nessa época, ela brigou e brigou para poder continuar o colégio, já que os pais achavam que até o quarto ano, para uma mulher, estava bom demais e era o que colégio da cidade oferecia. Ela insistiu tanto que conseguiu ir morar com uma irmã casada (foi dada muita importância a essa informação), em uma cidade vizinha, para continuar os estudos.

No colégio, ela conheceu um rapaz de 25 anos que a cortejou, cortejou e, um belo dia, pegou na sua mão. (Ah, o escândalo!) Alguém viu, e o falatório começou: "fulano mexeu com a filha do ciclano", "Darlene, filha de x, não é mais moça". Ela me jurou de com força que nada aconteceu. Mal sabe ela como esse detalhe é absolutamente desimportante.

A maledicência foi tamanha que chegou aos ouvidos do pai da Darlene. Com a honra da família em jogo, ele foi a pé até a cidade vizinha (segundo a Darlene, é como se fosse de Taguatinga ao fim de Ceilândia - cara, é chão!) para tirar satisfação com o rapaz.

O que ela me disse foi que o rapaz ficou com tanto medo que se calou. Lá estavam o pai dela e os pais dele, todos indo para cima dele, e ele sabia que, naquele ponto, não adiantava nada dizer a verdade. E, então, finalmente, ele decidiu assumir que fez "mal" a Darlene e dizer que assumiria a responsabilidade. Segundo ela, o pai ficou satisfeito e até começou a fazer amizade com a família do "noivo" ali mesmo. 

Faltou só jogarem pedra na Darlene
Nesse mesmo dia, ele, um homem de 25 anos, foi buscar sua noiva, de 14 anos, na casa dos pais. E, a ela foram dadas as seguintes opções: vai com ele ou vai para rua.

E, assim, no ano de 1998 (perceba, não foi em 1898), no Maranhão (não foi no Oriente Médio), uma menina de 14 anos foi entregue, por seus pais, a um homem onze anos mais velho. Pela honra da família.

Coisa de Novela: a alegria da noiva!
Ela me jurou que foi feliz e que gostava muito dele e da família dele, mas e se não gostasse? E se não quisesse? E quanto das coisas que ela sentiu ou sentia não foram mecanismos de adaptação ou defesa? Ela me jurou também que até hoje, na cidade dela, é assim. Detalhe: a filha da Darlene, depois da sua separação há dois anos, foi para o Maranhão morar com a avó. Sim, essa mesma, a mãe que entregou a filha pela honra da família.

Preciso do feminismo porque meus pais me chamam
de "piranha" desde que fui violentada aos nove anos

Pois é, a gente fica aqui achando que um mundo é um lugar mais ou menos até escutar uma mulher dois anos mais nova que a gente dizer: eu casei obrigada, aos 14 anos de idade.

Vai ver que é mesmo o fim do mundo. E se não for, cara, como esse mundo precisa do movimento feminista!

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