O preconceito de todos nós

por Thais Torres

 

Recentemente, o blog Homorrealidade publicou um excelente texto sobre mais uma declaração homofóbica. Os autores da agressão, dessa vez, foram os próprios homossexuais. Diversas manifestações na Internet comemoraram o fato de o filho do ex-jogador Ronaldo estar com cabelos tingidos e alisados e ter sido fotografado em um aeroporto, na companhia de um amigo. Ao que parece, o novo cabelo e a amizade fazem de Ronald um homossexual, algo que deveria ser comemorado.

O autor do texto faz um importante questionamento:

Porém, mais que especular a vida sexual de Ronald [que sinceramente ficou muito mais moderno com o novo visu], me surpreendi com tal discurso tortuoso de LGBTs. Afinal, será que dá para considerar alguém qualquer coisa que seja somente pela aparência? Será que somos tão retrógrados ao ponto de achar que um hétero não pode ter um amigo mais próximo? Ou alisar o cabelo? Será que ainda achamos que as travestis enganam as pessoas? E, o pior, será que ainda vemos a homossexualidade como uma ofensa ou uma maneira de desqualificar o outro?
 Antes que alguém pense que o blog acrescenta mais um item à lista de motivos que justificam a condenação dos homossexuais em nossa sociedade machista, o autor admite que "o gay nasceu em uma sociedade heteronormativa e machista". Isso explica o contraditório fato de que o público LGBT esteja ridicularizando um garoto por conta de seu penteado e de suas companhias. Dessa forma, se ele repete com cinismo e satisfação que é "bem feito" que o jogador tenha um filho homossexual, isso não ocorre por que os autores da "piada" acreditam que este é um "castigo" pelo fato de Ronaldo ter se envolvido com travestis no passado, mas por que o preconceito é tão enraizado em nossa sociedade que é repetido até mesmo por quem sofre as consequências da homofobia.

 

Sejamos sinceros. Quem nunca se viu rindo das piadas que caracterizam Marco Feliciano como um homossexual? Qual mulher nunca desejou ser bonita como determinada modelo ou atriz? Que pessoa nunca condenou - ainda que mentalmente - uma atitude, um palavreado ou uma roupa por que agir, falar e vestir-se de determinada maneira "não é adequado ao contexto"?

Logo em seguida, percebemos que há um preconceito no nosso riso, uma aceitação de estereótipos na nossa inveja, um machismo na nossa condenação. Afinal, vivemos em um mundo preconceituoso e é quase impossível estar alheio a toda e qualquer forma de discriminação.

 O problema  não é a momentânea repetição do discurso homofóbico e machista que nos rodeia, mas a perpetuação deste. O final do texto do blog www.homorrealidade.com.br vai direto ao que importa: "Para Ronald, um só desejo: se joga, boas férias!".





De fato, não importa se Marco Feliciano é gay enrustido ou se ele tem ascendência negra. O que importa é que ele é um político, mais do que isso, o presidente da Comissão dos Direitos Humanos e que recusa os direitos básicos de homossexuais e negros (dentre tantos outros indivíduos).




 
Também não importa se a modelo que está na capa da revista, na verdade, é gorda, tem espinhas e celulite. Ao lado vemos uma foto de Natalie Portman fora das capas de revistas e do tapete vermelho. Por um acaso, ela está linda, mas continuaria sendo uma excelente atriz se não estivesse. 
 



Na outra foto, o site de fofocas cria uma manchete pretensamente polêmica (mas totalmente rísivel como manchete jornalística): "Sem maquiagem, Juliana Paes revela olheiras profundas". O curioso é que ela ainda está linda, mesmo com as olheiras. Mas o mais importante é: a quem interessa uma notícia dessas?

 Mais sobre o preconceito de todos nós. Em reportagem na Carta Capital, uma jornalista questiona críticas feitas à Luana Piovani no processo contra o ex-namorado Dado Dolabela, que a agrediu fisicamente. Segundo muitos, Piovani é uma "celebridade cheia de dinheiro", "uma chata oportunista" que "estava bêbada em uma festa no momento da agressão". Sinceramente, também acho Luana Piovani uma mala sem alça, sei que ela é rica e não duvido que ela estivesse bêbada na festa em que foi agredida. Nada disso, porém, faz com que a agressão se justifique.

Não é o que pensam algumas das mulheres que comentaram a reportagem no site. Vale conferir. O preconceito está mesmo em toda parte.


Um comentário:

  1. Oi Thais, excelente texto. Este preconceito é sempre impiedoso e revelador para conosco, com as mulheres, e revela a cultura da dominação pela beleza: porque é certeza de lucro a divulgação de atrizes sem maquiagem, a piada da colega sem as unhas feitas, o cabelo com raiz, sei lá, essas coisas? É uma forma terrível de humilhar, porque as mulheres não tem direito a ter rosto, tem que ser bonecas perfeitas, para a cultura machista de dominação. Essa cultura tenta destruir as demais qualidades se ausente a beleza eterna e impecável, como se não importassem, fossem um adereço à beleza central. Quanto à Luana, também a acho uma insuportável, mas a culpa não é sempre da mulher, independente dos fatos?! As questões não se separam quando se trata do gênero feminino, o gênero é um fator preponderante, que não permite a imparcialidade social. Triste, triste.

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