por Tággidi Ribeiro
"Você é gorda, mas é limpinha. Você é feia, mas é de graça." Lembro-me de que, na época da faculdade (lá se vão quase dez anos), eu ria muito com Dalton Trevisan, autor dessa fala. Não é que tenha visto graça algum dia em destratar uma mulher por ser gorda ou feia - era o absurdo, a cócega nervosa do absurdo da violência verbal - que me fazia rir. Posto isso, digo o que penso: ser gord@ ou ser fei@ não é demérito, de forma alguma.
E ser gay, é? Para mim, é claro que não. Não há demérito em ser gay, negro, velho, mulher. Muita gente pode concordar comigo, afirmar que ninguém é menos por pertencer a essas categorias, mas será que, lá no fundo, não compartilha dos mesmos sentimentos/pensamentos do "Não tenho preconceito! (mas...)!"? Ou do "Não tenho preconceito, desde que seja..."?
Pergunto porque é comum ouvir gente dizendo: "O cara é gay, mas parece homem, aí eu respeito". Ou: "Tudo bem ser gay, desde que eu não saiba." Muito já se disse também sobre negros: "É preto, mas é do bem". "É preto, mas é honesto." (Na época em que eu era criança, era frase corrente, e era tida como elogio. É por essas e outras que eu acredito em mudanças.)
E chegamos ao século XXI. Da mesma forma que negros eram desculpados por sua cor e se desculpavam por tê-la, vemos homossexuais desculpados e desculpando-se. Quem desculpa os homossexuais? Para quem os homossexuais pedem desculpas? Respostas respectivas: quem não deve; para quem não devem.
Homossexuais são 'desculpados' por uma sociedade heteronormativa 'descolada', 'de bem', que aceita quem se comporta 'bem'. Ser gay pode, mas não pode parecer gay e precisa ter emprego estável, parceiro fixo também discreto etc. Homossexuais se desculpam diante desse conjunto heteronormativo dizendo: "Sou gay, mas sou honesto, sou trabalhador, pago minhas contas, sou discreto, não sou promíscuo". Quer dizer: um homossexual só pode escolher a quem devotar seu afeto e/ou seu desejo sexual SE preencher tais requisitos.
Agora, deixo que vocês me digam: como mulheres e velhos, por exemplo, se desculpam hoje? Como buscam respeito nesse nosso tempo, na nossa sociedade?
13 de julho de 2012
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Uma das piores de racismo que já ouvi é a (hoje fora de moda, ainda bem!) expressão "negro de alma branca".
ResponderExcluirE com relação às mulheres, tudo bem ser mulher, mas não muito feminista. Mas não muito ambiciosa. Mas não muito chata - o que na maioria das vezes significa reivindicar direitos.
Com relação aos negros de alma branca, vale uma procura na web sobre o processo movido contra o jornalista Paulo Henrique Amorim pelo também jornalista Heraldo Pereira.
ResponderExcluirNo caso, PHA disse que Heraldo era um negro de alma branca justamente por não lutar contra o racismo e contra a desciminação dentro da rede globo.
Foi processado por racismo (erroneamente na minha opinião) e entrou em acordo judicial depois. O assunto é longo, vale a pesquisa.
Acho que no caso das mulheres o 'não ser chata' vai um pouco além de reivindicar direitos. Pelo que percebo, a mulher é considerada chata simplesmente pelo fato de se 'impor' como indivíduo e exigir respeito como ser humano.
ResponderExcluirPor exemplo, já observei muitas vezes que se a mulher não se dobra às vontades do parceiro, mesmo que as mais absurdas, ela é a chata, estraga prazeres e afins. E não é só o parceiro ou os amigos que as considera assim, as amigas também (destaco o fato de serem outras mulheres, pois acho importante notar sempre que as próprias mulheres também perpetuam essa cultura prejudicial).
No geral, eu concordo com o que a Roberta disse. Td bem ser mulher, desde que não tente muito demonstrar personalidade e ser individualmente plena.
Boa, Patti! Mulher "com personalidade" é de doer mesmo. Você resumiu super bem, mulheres são consideradas "chatas" ou "de personalidade forte" simplesmente por se colocarem como indivíduos pensantes.
ResponderExcluirSobre a expressão "negro de alma branca", na origem ela é extremamente racista e quer dizer negro "bom". Seguindo a linha do que a Tággidi escreveu, o racismo do tipo "é negro, mas...". Eu não conhecia o caso do Amorim, mas nesse caso me parece que ele deslocou o significado. A intenção parece não ter sido discriminatória, mas usar uma expressão tão carregada como essa é sempre andar por um território perigoso (como se provou).
Uma discussão parecida acontece com relação à marcha das vadias, já que nem todo mundo concorda com o uso da palavra 'vadia', justamente por ter uma carga tão negativa, principalmente entre mulheres de classes mais marginalizadas, que experienciam a expressão de outro modo.
Anônimo, conheço um pouco o caso, parece que não havia mesmo intenção racista na fala de PHA.
ResponderExcluirSobre essas falas discriminatórias, já ouvi muito:
1) O cara é gay, mas parece homem, aí sim.
2) É preto, mas é bonito até.
3) É mulher, mas não é puta. Variação: ela é mulher de verdade. (WTF?)
4) É mulher, mas é inteligente. Variação: até que é inteligente para uma mulher. (Dói, né?)