A MULHER (A VIDA SE ESVAI, COMPANHEIRA)
(León Chávez Teixeiro, interpretada por Amparo Ochoa)
Abriu os olhos,
pôs um vestido,
e foi devagar pra cozinha.
Estava escuro e sem fazer ruído,
acendeu a estufa e a rotina.
Sentiu o silêncio como um aperto,
tudo começava no café da manhã.
Dobrou a coluna,
soltou um suspiro,
sentiu ridícula a esperança;
ao mais pequeno se lhe ardeu a pança,
rompeu o silêncio,
soltou um choro.
Serviu o esposo,
vestiu os meninos,
trocou as fraldas,
serviu os pães.
Levou seus filhos pra escola;
pensou no cardápio do dia.
Mediu o dinheiro,
comprou verduras.
Contou as cinzas de sua economia.
Esperou na fila por suas tortillas,
carregou Francisco,
olhou a rua.
Por toda parte havia mulheres,
todas compravam e se moviam;
seguiam ilhadas com seus deveres,
lhe recordavam todas à formigas.
Sentiu de repente que eram amigas,
sentiu que todas eram amigas.
Voltou a sua casa, casa alugada,
viu mais amigas desde a entrada.
Deu a Francisco o que brincar,
varreu o chão,
arrumou as camas.
Se viu no espelho,
olhando o branco dos cabelos,
juntou as coisas
pra cozinhar;
cortou as batatas,
as pôs no fogo
e na manteiga as fez chiar.
Agora o cru se transformava,
estava pronto para se almoçar.
A casa inteira com outro aspecto,
de novo ajeitada pra se usar.
Pôs a mesa,
serviu as crianças,
trocous as fraldas,
cortou os pães,
limpou de novo mesa e cozinha,
deu a Mercedes o remédio;
pediu seu turno nos tanques da lavanderia:
bateu vestidos e calças,
olhou ao sol a roupa estendida,
como se ontem já não o fizera.
A mesma esfregação todos os dias,
caminhando de novo o mesmo trecho,
sentiu a vida como prisão,
lhe escapava tudo que havia feito.
Se ia a vida, se ia pelo buraco
como o sebo, no tanque, pelo ralo.
Trocou palavras com suas vizinhas;
houve sorrisos em formação.
Toda a raça em seu beco,
se arrumando enquanto andavam.
Sempre mulheres, cumprindo oficios
que se entretecem sem ter fim.
Serem costureiras, serem cozinheiras,
camareiras e passadeiras;
serem enfermeiras e lavadeiras,
também garçonetes e educadoras.
Muito diligentes faxineiras,
às famílias deixam prontas,
rumo à escola ou para o trabalho
para que possam checar as listas.
Se dava conta de suas vontades
e do cinema sabia nada.
Para eles a vida sempre séria
se afogando na miséria.
Se vai a vida, se esvai pelo buraco
como o sebo, no tanque, pelo ralo.
Foi direto para seu ninho,
sempre pensando passou a roupa.
O que era rasgado deixou cerzido,
tinha um momento para descansar.
Abriu a porta e entrou o marido
também moído de trabalhar.
Pôs a mesa,
serviu a sopa,
para queixar-se não abriu a boca.
Riram juntos e papearam.
Falaram dos filhos e de dinheiro,
das vizinhas, de alguma dor,
dos caminhões e do patrão.
Lavou a louça,
tirou o lixo,
dormiu os meninos,
trocou as fraldas.
Como ar que entra pela fresta,
os dois brincaram com sua ternura.
E então deu a volta na fechadura;
dormiram cedo todos seus males.
Se vai a vida, se esvai pelo buraco
como o sebo, no tanque, pelo ralo.
Se vai, se esvai, companheira,
como o sebo, no tanque, pelo ralo.
(Tradução de Jeff Vasques)
Desmistificando o feminismo * rejeitando qualquer forma de discriminação * mostrando que feministas não mordem * popularizando a teoria feminista * subvertendo os papéis de gênero para libertar mulheres e homens
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