por Maria C.
Há uma ideologia perversa
rondando a vida das mulheres. Como um vento gelado, um vírus incontrolável,
essa coisa entra por todas as frestas, nos alcança por todos os lados, numa
espécie de Estado totalitário midiático nazista sei-lá-o-quê. Não dá pra
escapar: é o mito da beleza, a
ditadura da magreza, da juventude, da perfeição. Mulher que é mulher é linda,
jovem, magra, clara, bem cuidada, perfeita.
Não sou autoridade no assunto,
nem é o tema, mas durante o nazismo, buscou-se apoio científico, nas ciências
naturais da época, a fim de justificar-se a superioridade da raça ariana; da
filosofia, utilizando-se inadequadamente os ideais de Nietzsche: seu conceito
de super-humano em contraposição ao niilismo (em “Assim falou Zaratruschta”),
havendo suposta ligação entre o nazismo e o Übermensch; e ainda, aliada ao uso
pesado da mídia, foi utilizada a estética em favor do ideal totalitário. Hitler
afirmou que “o maior princípio de beleza é a saúde”. Isso soa tão familiar...
Decaídas as questões
políticas, militares e expansionistas, mas persistente o cinismo
pseudocientífico e a necessidade de dominação e de criação de uma espécie
superior – uma espécie superior de mulheres em relação às outras, as
supermulheres, ouso afirmar que estamos vivendo uma espécie de nazismo criado
especialmente para nós, mulheres.
Qualquer comercial de TV
destinado diretamente ao público feminino confirma a minha tese: “Cuidar das
axilas é fácil!” ou então “O que você faz para acabar com as pontas duplas?” Vejam só, as mulheres devem
inserir cuidados diários com suas axilas, que não bastam estar depiladas; devem
ser claras, lisas, esfoliadas e macias! E as pontas duplas, então? Seus cabelos,
pintados, alisados, chapados, hidratados, selados e sei-lá-o-quê devem
receber diariamente produtos para evitar as pontas duplas, pois onde já se viu
uma mulher ter pontas que não possam imitar uma franja? Nos filmes, nas novelas, nos
telejornais e também nos comerciais de TV, todas as mulheres são magras,
jovens, tem lindas peles e estão maquiadas, ao passo que os homens são normais:
têm gordos, magros, altos, baixos, jovens, velhos, carecas, cabeludos, com
dentes brancos ou amarelos.
Existe então uma nova raça,
de supermulheres, as mulheres perfeitas, e digo esteticamente perfeitas, e
somente estas têm dignidade para serem representadas na mídia? Ou melhor,
apenas estas representam as mulheres, de modo que as demais não merecem sequer
representação? Somos o terceiro estado pré-revolucionário, acaso? Um alienígena que
necessitasse coletar dados sobre a população feminina e partisse da
representação midiática sofreria um choque. Não acreditaria na disparidade
daquilo que vê na TV e nas ruas. Onde estão as mulheres perfeitas, se
perguntaria ele? Vivem no Olimpo?
A questão é: porque querem
nos fazer acreditar que precisamos dos “valores” que nos impõem, que precisamos
internalizar estes valores, que necessitamos tanto da transvaloração do que é
próprio do ser humano para apropriar “valores” femininos, tão externos e
estéticos, a fim de definir o que é uma mulher, ao menos uma mulher de verdade,
uma mulher bem sucedida, uma mulher perfeita. Por que de que adianta ter
uma bela carreira, ser respeitável em seu meio, mas esteticamente ser
considerada uma bruxa velha? É isso o que conta para as mulheres? Segundo aqueles novos
valores propriamente femininos impostos pelo ideário anti-feminino (o nazismo
feminino de que falo, em sátira), o poder, também inerente ao übermensch, no
caso da mulher, é inútil, se ela é feia, ou gorda, ou tem rugas, manchas na
pele, eventualmente um cabelo seco ou uma simples unha quebrada. Ela é menos
mulher. Em seu tamanho poder lhe debocham pelas costas, onde já se viu uma
mulher dessas não fazer as unhas? E por que, querida leitora,
eu lhe pergunto, porque nós concordamos com esses editoriais nazi-fascitas em
revistas sorridentes, que dizem que devemos pesar 50kg aos 45 anos e, deus nos
livre, ter celulite? Por que corremos às lojas de cosméticos atrás dos hidratantes
de axilas, dos esfoliantes de cotovelos; das clínicas de estética, dizendo
amém, e socorro, sou um lixo humano e não mereço viver pois tenho cílios
curtos?
Porque há uma diabólica
conspiração, tão evidente e escancarada, e há tanta gente lucrando com isso,
que não nos questionamos mais: mulheres feias não têm representatividade,
direitos, nem dignidade: não é mais literário (desgraçado Vinícius), é
constitucional e científico, afinal, magreza anoréxica de passarela é saudável,
e qualquer 200g a mais é obesidade mórbida. Tudo saúde, e morte aos gordos,
porque barriga não é mais um órgão, mas um pecado mortal, uma coisa horrorosa,
banida da TV, e isso é sério.
Minha ironia se deve à
raiva, ao desprezo mesmo à tamanha tentativa de dominação da força feminina.
A tentativa de confinamento
das mulheres no espelho, centradas em seu umbigo é repulsiva. Trata-se de uma estética de destruição, querem que nos rasguemos, nossas próprias algozes, de modo que
assim, deixemos o caminho livre para que qualquer um nos explore, e explore qualquer
necessidade patética que resolvam nos impingir, tais como hidratar as axilas ou
viver de dieta intravenosa, um dogma! A revolta é grande.
A
solução? Diante de uma cultura de dominação forte/fraco, lógico/sentimental,
tão arraigada e imposta tão covardemente que acreditamos que se funda na
ciência, e é inata (!), é preciso de um movimento contrário de idêntica força,
que parta da rejeição desta cultura. Um despertar já seria um
começo. Conhecer a verdade e descobrir que não precisamos de nada do que nos
dizem já é um passo a caminho da liberdade. Abra sua mente. Diga não.
Quem
sabe?
A pressão de ser perfeita fisicamente é algo que nos consome todos os dias e destrói nossas auto-estimas, sinto frustração em ver nos resumirem à beleza física. É algo que de fato precisa ser modificado para anteontem... Mas hoje em dia mais do que a magreza o que mais cai na desgraça é o estereotipo de "gostosa", do peitão, do bundão, de tudo durinho e em ordem, porque afinal se não for assim, não vai ser legal, vai ser a banhuda ou magricela sem graça, e tudo isso só para alimentar ainda mais o anseio dos machinhos criados sedentos por pedaços de carne. Vejo diversas mulheres sofrendo ou porque são muito magras, ou por serem mais cheinhas, ou ainda serem "normais" e ainda não se sentirem completas porque a cada instante que liga a TV ou abre uma revista tem alguma mensagem berrando como é necessário pagar para se "transformar" em alguém melhor. Crise de valores, cada um tem sua beleza, interior e exterior, e ninguém deixa de ser menos mulher por ter uma axila escura, ou um cabelo mais encrespado, etc... nós mulheres precisamos aprender a sermos criticas e a não deixarmos essas mensagens nos rebaixarem. Um passo bom seria entrarmos na publicidade e virarmos as propagandas em nosso favor, usar dos meios da internet como vc fez, assunto importante para se bater na tecla!
ResponderExcluirOi Ellen, adorei seu comentário! Falo da magreza porque é um padrão mais "universal", mas concordo plenamente com você, que há pressão pelo estereótipo gostosa. Como você bem coloca, o problema é ser perfeita, não ser "normal" esteticamente, embora essa estética não-normal rejeite a diferença, nos transformando em objetos padronizados, formas do mesmo tamanho e espécie, irônico e paradoxal. Me entristece o fato de que a publicidade e a própria indústria poderia lucrar com essa diversidade, inovando, ao invés de persistir no histórico de eterna dominação, agora pela beleza. Temos muito a denunciar. Beijos e obrigada!
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