Por Thaís Bueno
Que o Brasil é um país onde se assiste a muita televisão, não é novidade. Segundo uma pesquisa Ibope de 2012 (quadro abaixo), o brasileiro assiste à TV por uma média de 5 horas e meia por dia. Obviamente, trata-se de uma média, que pode ser jogada para mais ou para menos dependendo de inúmeras variáveis: idade, classe social, gênero. É interessante notar, no entanto, que no meio desse mar de números e estatísticas (que parecem não dizer muita coisa), há um dado interessante: cada vez mais a TV por assinatura cresce em termos de audiência, roubando uma fatia do bolo que antes era servido às grandes redes de canais abertos.
Que o Brasil é um país onde se assiste a muita televisão, não é novidade. Segundo uma pesquisa Ibope de 2012 (quadro abaixo), o brasileiro assiste à TV por uma média de 5 horas e meia por dia. Obviamente, trata-se de uma média, que pode ser jogada para mais ou para menos dependendo de inúmeras variáveis: idade, classe social, gênero. É interessante notar, no entanto, que no meio desse mar de números e estatísticas (que parecem não dizer muita coisa), há um dado interessante: cada vez mais a TV por assinatura cresce em termos de audiência, roubando uma fatia do bolo que antes era servido às grandes redes de canais abertos.
Segundo pesquisa realizada pela Agência Nacional de Telecomunicações, em 2011, a TV paga atingiu, no Brasil, um crescimento de mais de 21,7%, chegando a quase 12 milhões de domicílios. Seria interessante pensar nos fatores que ocasionaram esse crescimento, mas, agora, penso em outra questão: quais seriam as consequências desse crescimento processo de recepção de conteúdos pelos telespectadores brasileiros, considerando o espaço e os papéis das mulheres nos programas exibidos nos canais fechados? Como muita gente sabe, as séries estadunidenses, ou sitcoms, predominam na programação de boa parte desses canais fechados no Brasil, e estão cada vez mais populares entre os brasileiros.
Seria interessante, então pensar: como é representada a imagem da mulher nesses seriados? Será que a mulher brasileira (ou as mulheres brasileiras) pode se identificar com os modelos femininos propostos por essas séries?
Felizmente, há muitos estudos interessantes feitos sobre o alcance desses programas de TV no Brasil e os padrões que eles disseminam. Segundo um desses estudos (BEZERRA, 2008), mesmo nos casos em que tais seriados se dedicam a contar histórias de mulheres (nessa categoria, o famoso Sex and the City é o que primeiro me vem à mente) e suas conquistas no momento atual de avanço das lutas feministas, essas conquistas se restringem a questões da esfera privada, não representando uma grande mudança no âmbito público:
...podemos ver a representação, feita através do discurso da personagem-narradora, de uma mulher que, sim, está num momento histórico decorrente de duras conquistas, um momento em que pode expressar o que pensa sobre variados tópicos, como: sexo, trabalho, amizades, espiritualidade e casamento. No entanto, podemos concluir que essa sua atuação ainda se restringe à esfera privada, em que suas preocupações, anseios, ações e relações não estão representadas como tendo impacto no âmbito social/público, esfera que historicamente vem sendo reservada aos homens.
Seriado Sex and the City: questões femininas podem ser interessantes, mas se restringem à esfera privada |
É curioso pensar nessas análises dos seriados de TV levando em consideração quem é que escreve e produz esses programas. De acordo com o WGAW 2013 TV Staffing Brief, um estudo feito pelo The Writers Guild of America (sindicato que representa os escritores do setor cinematográfico e televisivo dos Estados Unidos), o grupo de profissionais que escrevem os programas de TV produzidos lá (e assistidos aqui) é constituído, predominantemente, por homens brancos. Muito pouco espaço é concedido a mulheres ou a mulheres ou homens negros no processo de produção do conteúdo que é exibido pelos canais de TV: nas temporadas 2011-2012, dos 1.722 roteiristas envolvidos na produção desses programas, apenas 519 (ou 30,5%) eram mulheres, e só 269 eram negrxs.
Além desses números, o sindicato apresentou, no estudo, uma lista de séries de TV que não incluíram roteiristas mulheres ou negrxs em suas equipes de produção:
:: Lista de programas de TV que não incluíram roteiristas mulheres na produção (temporada 2011-2012):
America’s Funniest Home Videos
Big Time Rush
Californication
Comedy Bang! Bang!
Dancing With The Stars
Eagleheart
Enlightened (Creator Mike White wrote all the episodes)
Futurama
Geniuses
Gurland On Gurland
The Insider
Kickin’ It
Locke & Key
Magic City
Psych
Teen Wolf
Veep
Workaholics I
Workaholics II
:: Lista de programas de TV que não incluíram roteiristas negrxs na produção (temporada 2011-2012):
America’s Funniest Home Videos
Anger Management
Are You Smarter Than A Fifth Grader
Baby Daddy
Best Friends Forever
Big Time Rush
Blue Mountain
State
Boss
Breaking Bad
Californication
The Client List
Comedy Bang! Bang!
Dancing With The Stars
Eastbound and Down
Enlightened (Creator Mike White wrote all the episodes)
The Firm
Free Agents
Futurama
Game of Thrones
Geniuses
A Gifted Man
Glee
Good Luck, Charlie
Gossip Girl
Gurland On Gurland
Happily Divorced
Hart of Dixie
Homeland
How To Be A Gentleman
The Insider
Jane By Design
Kickin’ It
Lab Rats
Last Man Standing
The League
Longmire
Make It Or Break It
Man Up
Mike and Molly
Napoleon Dynamite
Once Upon A Time
One Tree Hill
The Protector
Ray Donovan
Revenge
State of Georgia
Stevie TV
Two And A Half Men
Veep
Web Therapy
Weeds
Workaholics I
Workaholics II
É frustrante notar que as listas são enormes. E, mais frustrante ainda, perceber que, entre esses programas, há alguns direcionados ao público infantil ou infanto-juvenil, como Futurama e Big Time Rush.
Como se pode imaginar, uma das consequências de termos apenas roteiristas homens e brancos escrevendo os programas televisivos aos quais assistimos é a homogeneização das histórias que esses programas contam e que, obviamente, não representam a mulher brasileira. No entanto, é preciso fazer uma ressalva: um roteirista ou escritor branco pode, sim, apresentar um retrato interessante e complexo da atual situação feminina ou mesmo da cultura negra. Como escreveu Alyssa Rosenberg, esse seria o caso dos seriados Enlightened (que apresenta questões interessantes sobre o universo feminino) e Breaking Bad (que inclui em sua trama histórias interessantes de personagens negrxs). Mas isso não justifica que tais histórias sobre mulheres ou negrxs sejam sempre contadas por homens brancos. Obviamente, como bem mostrou a escritora nigeriana Chimamanda Adichie em sua palestra no TED (ver vídeo abaixo), ouvir nossa história ser contada por outros pode ser interessante e enriquecedor, mas é também importantíssimo termos o espaço para podermos contá-las por nós mesmos.
Referência bibliográfica:
BEZERRA, Fábio Alexandre Silva. Sex and the City e a representação da imagem feminina. Anais do CELSUL 2008. Disponível em: http://celsul.org.br/Encontros/08/sex_and_the_city.pdf. Acesso em: 01 abr. 2013.
Olá, Thais.
ResponderExcluirAchei interessante teu texto! Conseguiste tratar de uma maneira bem acessível e embasada (sem ser pesada - pela característica do meio de veiculação) uma discussão bastante importante na sociedade pós-moderna. Agradeço a citação de publicação minha! Este foi apenas um recorte ilustrativo de minha dissertação de Mestrado. Atualmente, já conclui o doutorado, onde também tratei de Sex and the City, mas não mais a série de TV, e, sim, o primeiro filme. Nessa pesquisa mais recente, analisei a linguagem verbal e as imagens também. Também já tenho outras publicações que podem ser facilmente encontradas por meio de pesquisa rápida no Google, caso tenhas interesse em conhecer mais sobre o tema, e, especialmente, outras tantas pesquisas na área, as quais cito e discuto a fim de situar o lugar acadêmico/social onde a minha se situa.
Abraço,
Fábio Bezerra