por Mazu
Página "Não Aguento Quando" no Facebook. |
Há dois dias, minha cunhada publicou um vídeo no Orkut
(sim, no Orkut!) em que um metaleiro destilava muito julgamento sobre o que ele
chamou de pirirockers (deve significar algo como piriguetes do roquenrol). Não
conheço o cara, mas ele fez questão de dizer que estava lá criticando a
hipocrisia das meninas que usam roupa curta, mas são roqueiras, e ficam
criticando as meninas que usam roupa curta e escutam funk. Provavelmente, a
hipocrisia que ele detectou existe. Se realmente há alguém que usa roupa curta
criticando alguém que usa roupa curta, sim, há hipocrisia. Mas essa não é a
questão. Ainda que ele tenha se explicado e dito literalmente "as pessoas
podem fazer o que quiser e ser feliz, não tenho nada com isso", o vídeo
é machista, não parece, assim de parecer logo de cara, mas é. Muito
provavelmente, essa não foi a intenção do autor e, muito provavelmente, vários
de nós (si, jo también) destilamos machismo de quando em vez, sem nos darmos
conta. E por que, meu Deus, por quê? Porque a ideologia do patriarcado é tão
embebida, incutida nos nossos costumes que pode passar despercebida.
Femstagram no Facebook |
Um exercício interessante, inclusive para xs
companheirxs recém chegadxs no movimento, é se escutar falando. Loucura, né?
Mas, é isso mesmo. Na grande maioria das vezes, quando uma afirmação só serve
para homens ou mulheres, essa afirmação está lá com seus 90% de chance de ser
sexista. Vou usar como exemplo o vídeo que minha cunhas postou. Não é
semanticamente possível dizer "os pirirockers", certo? Quero dizer,
não rola tirar sentido da expressão, assim sem um contexto mais específico.
Rola dizer "maria-palheta", um termo usado para groupies, e fazer sentido,
mas não rola dizer "joão-palheta" e fazer sentido, novamente, sem um
contexto que nos ampare. Não quero comprar briga com os compas da linguística,
então já adianto, com contexto e interação tudo pode na linguagem. Mas, vamos
supor, ainda que um contexto específico nos permitisse tirar sentido dessas
expressões, eles não seriam exatamente iguais, não carregariam o mesmo pacote
de sentidos, porque estamos em uma sociedade com esse e aquele discurso
anterior, ou seja, esse e aquele preconceito já estabelecido. Vide o cara
"galinha" e a mina "galinha", que trazem significados bem
diferentes empregados aqui e lá.
Alguém poderia dizer: tem coisa que só homem
faz, tem coisa que só mulher faz. A resposta mais simples para isso, além de
"oi, século XXI?" é que essas coisas só de homem ou só de mulher têm
que ter explicações muito biológicas mesmo, muito provavelmente envolvendo o
uso direto da genitália. Do contrário, a gente pode detectar sexismo novamente.
A Rô trouxe uma discussão legal sobre isso, quando tratou dos brinquedos demeninas e meninos.
Esses atos falhos nossos acontecem para o bem e
para o mal, o tempo todo. Dia desses, um amigo publicou no facebook:
"fulana de tal (que fez x e y): uma mulher para entrar na lista de
mulheres que fizeram diferença na humanidade". Sério, lendo isso, a gente
não fica com aquela impressão de que quase não existiu mulher para fazer
diferença? Pois é.
E não rola só com mulheres, dizer que os homens
são todos canalhas é tão sexista quanto dizer que as mulheres são todas
interesseiras. Toda discriminação ou papel já estabelecido, sem explicação
biológica (eu ia dizer racional, mas não seria suficiente), para um gênero
implica sexismo. Dizer que é dever do homem pagar as contas é sexista também. E
assim vai.
Créditos: Femstagram no Facebook |
Todo mundo escorrega, não rola dizer que não. Se
em determinado momento da vida, alguém pisa no calo e a gente vai falar mal ou
discutir, uh, como rola preconceito. Eu tenho irmã, eu sei como é. Deus me
livre daquela máxima "Não sou machista, nem feminista, sou humanista"
porque, sério, isso é um uso super errado de todos, todos, todos os termos da sentença!
Machismo não é o contrário de feminismo, nem os humanistas têm nada que ver com
a bagaça toda. Mas o ideal, para evitar os escorregas sexistas nossos de cada
dia, era a gente usar "pessoa" ou "gente" nas afirmações
para evitar, né? Tipo "tem gente interesseira" não "tem mulher
interesseira". E, aí, se me for permitido um adendo fora do escopo do blog
e do post, melhor mesmo seria tentar ser positivo e não ficar de mimimi por aí
e dizer que "tem gente legal no mundo", sei lá, talvez isso ajude na
tarefa complicada de gostarmos uns dos outros.
Não Aguento Quando novamente |
Voltando, a dica das tias de hoje, que serve pra
tia também, é: quando a gente for criticar alguém, para evitar cairmos em
qualquer armadilha linguística do preconceito, vamos tentar trocar o
"x" por "pessoa". Assim, ó: na frase "tinha que ser
X", sendo x = mulher, gay, preto, nordestino, gordo, se a gente não puder
trocar x por "pessoa" e conseguir sentido, que liguemos o alerta do
preconceito, porque há, talvez não seja evidente, mas há.
28 de janeiro de 2013
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Caras tias, me ajudem! Talvez minha dúvida/comentário não tenha relação direta com o post, mas é algo que tem me incomodado profundamente e quase tem causado uma guerra nuclear: tenho uma sobrinha de 02 (dois) anos, e a mãe e as outras tias têm educado a menina completamente diferente de meu sobrinho que tem 04 (quatro) anos. Quando tinha a mesma idade o menino sabia todas as cores, todas as letras, e contar até 20. Não é lá grandes coisa, mas fiquei chocada que a menina só conhece a cor "rosa" (muito simbólico) né? Todas as outras cores que eu perguntava a ela, me respondia prontamente "rosa" e todos achavam lindo! A menina também não pára de dizer que parece a Barbie, perguntar se está parecendo a Barbie... Acontece que é a mãe que manda a menina perguntar a todos se está parecendo a Barbie, se o vestido que colocou se parece com o da Barbie, enfim, não consigo ver aquilo sem contestar, amo minha sobrinha e sei que diabos, que fardo maldito esta imposição de parecer a Barbie, o que será um baita choque no futuro, já que ninguém pode se parecer com a Barbie (não é real). Porque ela só pode conhecer o rosa, enquanto meu sobrinho já está aprendendo a ler, sabe jogar joguinhos de estratégia e a coitadinha preocupada com as unhas? Eu gostaria de uma técnica de liberação, que me libertasse de não me preocupar com a educação sexista que os outros impõe, que no caso ridiculariza minha sobrinha e a torna menos que uma boneca-palito, ou então, uma técnica para mostrar isso à minha cunhada. Existe, sem que isso magoe seus sentimentos? Eu tentei mostrar que ela não conhecia as cores, mas me ignoraram... Me ajudem, por favor!
ResponderExcluirOlha, sua situação é bem complicada. Quando se trata de família, a gente tem que ter algum cuidado. E se você chegar chutando o balde, talvez eles afastem sua sobrinha de você, o que não seria legal. Se você tem alguma intimidade com sua cunhada e seu irmão, uma conversa com os dois seria legal. Mas de leve, os pais costumam se irritar quando alguém de fora diz que estão errando. Eu, se fosse você, passaria o máximo de tempo com sua sobrinha e tentaria influenciá-la de outra forma. Você pode até usar a Barbie de porta de entrada, já que é o grande interesse dela. A Barbie pode ler e ser médica, e aprender as cores. Sei lá, criança e família, se você chegar contrariando com força pode dar errado. O ideal é ir contrariando aos poucos ;)
ExcluirMuito obrigada Mazu! Não é fácil ver uma criança se resumindo a um estereótipo. Eu já andava me esgueirando e tentando ensinar algumas coisas com sutileza, as cores, pelos esmaltes e lixas de unhas, por exemplo, rsrs (ohh my). Assim continuarei, é um alívio.
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